Imagem: Frankie Fouganthin (Own work) [CC BY-SA 4.0 (http://creativecommons.org/licenses/by-sa/4.0)], via Wikimedia Commons

Sexta-feira, 7 de abril, por volta das 10 horas da manhã meu celular sinaliza a chegada de uma informação do serviço de notícias do Le Monde: um caminhão se chocou contra a vitrine de uma popular loja de departamento em Estocolmo ferindo transeuntes e fregueses. Cerca de 10 minutos depois, o New York Times me brinda com a mesma notícia. O primeiro ministro Sueco fala em suspeita de ataque terrorista.

No dia anterior os Estados Unidos haviam bombardeado a Síria, matando muitos civis em uma ação que gerou – e continua gerando – especulações sobre as novas configurações da desordem mundial.

As reverberações imagéticas dessa guerra de guerrilha são parte intrínseca das ações bélicas. Agentes dos órgãos de segurança ao redor do planeta são sensíveis às maneiras como seus movimentos chegarão aos diversos segmentos do público.

As técnicas de guerrilha seja de Estado ou de oposições envolvem formas narrativas. Há como evitar que a rede mundial se torne refém de ataques sanguinários-imagéticos, seja de poderes instituídos ou não instituídos?

Agentes bélicos assumem o caráter de performance ao vivo de suas ações e se planejam para reduzir a dose de imprevisibilidade, de maneira a garantir o sucesso de plots que dependem de montagem ao vivo, com transmissão simultânea pela internet e através dela nas mais diferentes janelas.

Voltando ao caso quase banal do atentado do caminhão em Estocolmo. A história não fosse notícia, ao menos fora da Suécia.

Mas uma facção do movimento islâmico aparentemente se formou em torno da adesão a atentados que usam caminhões como arma. A suposta dissidência da Al Quaeda, especializada na técnica, seria responsável por essa ação de guerrilha contra civis. Nice, Berlim, Estocolmo. Uma tentativa frustrada na Bélgica.

Os jornais online registram em primeira mão a imagem do caminhão atravessado na rua, ocupando também a calçada.

Em Nice um caminhão enorme se deslocou em uma área destinada à parada de 14 de julho. Em Estocolmo, o caminhão é mini, não há barreiras na rua, data ou comemoração oficial.

A semelhança entre o ataque e o acidente talvez seja a característica mais assustadora da ocorrência. O alvo não é uma personalidade, não é uma instituição, não é uma data comemorativa, não é uma nação, uma etnia, um credo religioso. Qualquer dia, qualquer um, em uma parte significativa do globo.

Diante da banalidade do espetáculo, a rotina cotidiana – cozinhar, comer, limpar, amamentar, cuidar, nutrir, – passa a ser excepcional. Uma roça, um feijão cozido na panela de pressão, uma farofa de milho, uma boa pimenta malagueta. Seria essa a base de uma pauta alternativa?

É o que sugere o cineasta experimental austríaco Peter Kubelka em uma de suas performances.

Imagem: annettefromaustria via Visual hunt / CC BY-NC

Esther Império Hamburger

Profa. Titular do Dept de Cinema, Rádio e Televisão da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. PhD em Antropologia pela Universidade de Chicago. Foi Visiting Scholar no Center for Latin American Studies da University de Harvard, Visiting Professor no Center for Latin American Studies da Universidade de Michigan e fez pós doutoramento na Universidade do Texas, Austin. Fez graduação e mestrado em sociologia na FFLCH da USP. Atualmente é Coordenadora do Laboratório de Investigação e Crítica Audiovisual (LAICA) e chair da Rede UNITWIN da UNESCO e UNAOC em Media and Information Literacy and Intercultural Dialogue. Autora do livro "O Brasil antenado: a sociedade da novela". Escreveu regularmente para a Folha de S.Paulo.