Ilustração: João Grego

A humanidade sempre procurou formas de medir o tempo: através de fenômenos naturais, do relógio de pulso estruturador do tempo do capital, até as medidas que parecem não comportar o espaço do universo, exigindo, para que atinjamos as mais distantes estrelas, viagens de milhões de anos à velocidade da luz.

Historiadoras e historiadores, no entanto, chamam a atenção para o fato do “tempo cronológico” não corresponder ao “tempo duracional”, e, até mesmo, para o fato de existir diversas formas de experimentar o tempo, e que as definições de passado, presente e futuro são construídas socialmente. Dois grandes pensadores, Eric Hobsbawm e Giovanni Arrighi, divergiam quanto às interpretações sobre o século XX: para o primeiro, tratava-se de um “curto século”, circunscrito da Grande Guerra iniciada em 1914 ao término da União Soviética; para o segundo, o século XX teria sido um “longo século”, cujo entendimento somente seria possível se os acontecimentos do século XIX fossem incorporados na análise.

Essas pequenas considerações sobre a história e o tempo servem para justificar o título desse texto, cuja ideia tomo emprestada de Arrighi para compreender o ano que se inicia. Porém, o que pretendo demonstrar é que 2018 se iniciou apenas cronologicamente, porque ele já se encontra, há tempos, na pauta do dia dos debates sobre o principal tema que nos interessa aqui: as eleições de 2018 e a liberdade de expressão. Não que anos eleitorais não suscitem preocupações antecipadas, estratégias calculadas, geram expectativas e prognósticos. Porém, em uma conjuntura de crise econômica e política, após o golpe de 2016, com ameaças às candidaturas dos dois principais candidatos representantes da polarização política atual, é inevitável que o pleito de 2018 adquira novos contornos, inclusive com a possibilidade que não se encerre nesse ano, como ocorreu em 2014, com pedido de recontagem de votos, impugnação de chapas, etc.

Para reforçar a argumentação da longa duração do ano de 2018, em 13 de junho de 2017 o IBOPE Inteligência divulgou uma pesquisa em que os entrevistados, ao serem perguntados se determinados canais terão muita influência, pouca influência ou nenhuma influência na escolha do candidato ou da candidata à Presidência da República, responderam que a internet e as redes sociais têm muita influência (36%), seguido da mídia (35%) e de conversas com amigos (29%). Em resumo, 56% dos eleitores afirmam que a internet e as mídias sociais têm algum grau de influência na escolha de seu candidato presidencial na próxima eleição.

Frente a esses dados, foram organizados, no final de 2017, uma série de eventos que demonstraram a preocupação com as fakenews e com os robôs incitadores de ódio. A expectativa entre os participantes é que, se não forem criados mecanismos de regulação dessas ações, seus números triplicarão durante o período eleitoral.

Nesse sentido, tenho uma segunda colocação a ser feita, a partir de outro dado. O Portal CTRL+X, organizado pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) afirma que, até o momento (janeiro de 2018), foram registradas 1.862 ações de políticos na justiça contra a divulgação de informações, estando o PSDB em primeiro lugar no número de requisições judiciais (309, representando 16%), seguido do PMDB (253, 13%) e do PT (200, 10%). As alegações não aparecem no ranking presente na página inicial do portal, mas grande parte das ações são motivados por difamação, tornando o debate mais complexo: em alguns casos não se trata de mera censura, mas de ausência de compromissos éticos e profissionais de aferição das informações antes de sua divulgação.

Não me atrevo a nenhuma previsão, porém compreendo porque o ano de 2018 começou antes mesmo da meia noite do dia 1º de janeiro, extrapolando-o em sua duração. Que possamos acompanhar os desafios que a campanha eleitoral de 2018 colocará à liberdade de expressão, com a perspectiva, sempre, de uma qualificação do debate.

Caroline Silveira Bauer

Professora do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, onde atua na graduação e na pós-graduação. Entre 2011 e 2013, trabalhou como consultora da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. É autora de diversas obras sobre a temática da ditadura civil-militar brasileira, integrando grupos de pesquisa e investigação nacionais e internacionais.